1x03 Blues

- Acho que é agora.
- É... tem certeza?
- Claro que sim, não aguento mais essa vida que levamos.
- Não tem outro jeito?
- Não sei, não quero saber e tenho raiva de quem sabe.
- Então acaba logo com isso. Não é melhor deixar um bilhete?
- Não, sem bilhetes. Será que...
- O que?
- Nada, vamos logo.
- ESPERA! Também estou cansado de tudo e tal, mas podemos sumir, desaparecer e recomeçar em outro lugar, o que você acha?
- Acho que estamos demorando demais com isso...
- Pensa um pouco antes...
- Não quero pensar em nada. Nada de planos, desejos ou qualquer outra coisa que nos faça desistir. Não quero desistir. Preciso acabar com isso.
- Você vai se arrepender e não tem como voltar atrás... Pensa...
- Não quero.
- Por favor!
- Não.
- Por nós. Por toda essa vida juntos.
- Por que você sempre faz isso?
- Isso o que?
- Isso! Me faz desistir sempre que tento.
- Não faço. Só quero que você não se arrependa. Se for pra fazer, tem que ter certeza absoluta.
- Tenho certeza absoluta!
- Mesmo?
- Não... sim... sim.
- Não tem!!
- Tá, e dai?
- E dai que sem certeza absoluta não dá pra fazer nada. 
- Claro que dá, e estou fazendo! Olha!
- Nãããão! Para, por favor!
- Nossa como você é chato. Eu quero e pronto.
- Eu não quero. Não estou preparado.
- Mas eu estou.
- Sem minha vontade você não pode fazer nada.
- Posso sim. Posso e vou!
- Para! 
- Não.
- Vamos mudar de vida e conseguir felicidade.
- Não existe felicidade pra mim. 
- Para de ser bobo, existe sim.
- Será?
- Existe! Por que não mudamos de país?
- Por que nunca temos dinheiro.
- Vamos trabalhar e economizar.
- Demora muito e eu não suporto mais.
- Suporta! Te ajudo.
- Mesmo?
- Mesmo, prometo.
- Não sei...
- Vai larga logo essa corda!
- Pensei que você não ia insistir, que não se importasse...
- Me importo sim! Nunca te deixei fazer essa besteira. Não é agora que ia deixar, ainda mais nessa situação.
- É, eu sei.
- Você sabe que sempre será assim. Se você morrer, eu morro.

1x02 Vida de Merda

Oi! Meu nome é Amaro e eu sou azarado. Eu sei que esta não é a melhor forma de se iniciar uma conversa, mas é bom que você já esteja preparado para o que pode te acontecer caso viremos amigos. O meu azar não passa por osmose, eu sei, mas é bom prevenir. Vai que... E vamos deixar claro: isso não é drama, ok?!

Eu tenho 23 anos e há 20 eu sou azarado. Pelo que eu lembre, a margem de erro é de três anos para mais. A minha primeira história de azar aconteceu quando eu tinha 4 anos, na vez em que eu passei o dia todo de castigo na "cadeirinha do menino mau" porque eu não respondi a pergunta que a Tia fez: "Amarinho, quantas maçãs verdes têm na cesta azul?". Silêncio. Mais uma vez: "Amarinho, diz pra tia quantas maçãs verdes têm na cesta azul.". Mais silêncio. "Amarinho, castigo!". 

O que ninguém disse à retardada da Tia, é que o Amarinho estava sem voz e por isso não respondeu que havia três porras de maçãs verdes na porra da cesta azul! No fim do dia, a coordenadora chega na sala para dizer que minha mãe havia ligado desde cedo avisando que eu estava afônico e a puta da secretária tinha esquecido de passar o recado. Sem traumas, fui chamado de "mudinho" por toda  a infância.

Na adolescência, malandro, se dava bem nas festinhas... Erm, não.
- Amaro, aquele que te com... Ah, não! Porra, Amaro, tu nunca vai comer alguém nem atrás do armário!
Resultado: fui o veado da turma dos 15 aos 19. E sabe o pior? A profecia se cumpriu! Me pergunto se meus amigos ainda me chamam de veado pelas costas. 

Não bastasse ser o veadinho, ninguém gostava de fazer trabalhos comigo. Não por terem algum receio de que uma hora eu tascaria um beijo em algum deles, mas porque os professores tinham uma cisma infernal comigo. Juro, eu não podia piscar durante uma aula que o desgraçado do professor já parava a aula e dava um sermão de 20 minutos me usando como exemplo. Daí, na hora das provas e avaliações de trabalhos, o meu grupo sempre era epicamente humilhado diante de todos os outros alunos. "Trabalho em grupo como segunda prova! Opa, Amaro, sem grupo de novo?"

Atualmente, na "fase da curtição" eu me fodo o dobro. Mês passado fui ajudar um amigo com um brotinho, mas o filho da puta esqueceu de me avisar que a mulher era casada. O marido chegou, me viu perto da mina e já partiu para a ignorância. Saldo da pancadaria: um nariz quebrado, dois dedos tortos, um olho roxo (todos meus!), o fim de um e início de outro relacionamento (nada meus). 

Outra vez flagrei meu chefe, depois de me chamar de bichinha, falando para a sócia (e amante também que eu sei) que iria me demitir. Ao ser questionado por que faria isso, já que eu sou um dos funcionários mais produtivos (azarado, mas competente), ele soltou: "Porque eu odeio veado. E veado competente é uma merda, toda hora dá pinta. Sem falar que eu acho esse moleque tá me cantando".
POOOOOOOORRA!

Eu sei o que você está pensando: o meu problema é só me relacionar com gente filha da puta. Pois este é o meu maior azar. 

1x01 Amor Passageiro


Li em algum lugar que os sonhos são nada menos que um conjunto de imagens, pensamentos ou fantasias que se apresentam à mente durante o sono. Eles se formam durante  o R.E.M., uma fase do sono onde ocorrem os sonhos mais vívidos. Isso ocorre, se minha memória não está falhando como tudo o mais na minha vida, pois os nossos olhos, durante este momento, movem-se rapidamente e a atividade cerebral é semelhante a quando estamos acordados.

É durante o R.E.M., também, que o despertador insiste em tocar. Por mais maravilhoso que esteja sendo seu sono, por mais aplausos que você esteja recebendo dos seus fãs depois de uma apresentação espetacular de Digital Love, por mais que sejam poucos os centímetros que ainda restam entre seus lábios e os do seu príncipe, ele não atrasa um minuto e sua campainha toca irritantemente. Por exemplo, ele vai tocar ag...

TRRRRRRIIIIIIIIIIIM! TRRRRIIIIIIIIIIM!

"Mais um dia, que saco!" foi a primeira coisa que pensei quando o despertador tocou.
Não imaginava encontrar aqueles olhos verdes no ônibus hoje de manhã. Não imaginava que existisse tamanha perfeição.
Tudo começou quando, como de costume, peguei o ônibus, e como de costume, estava mais lotado que estádio de futebol na final de campeonato. As velhinhas de sempre, os trabalhadores de sempre, os adolescentes chatos falando alto de sempre... E então ele apareceu. Ficou em pé ao meu lado e esbarrou sem querer na minha mão.
"Desculpa...", balbuciaram rapidamente aqueles lindos lábios finos.
"Foi nada",disse logo em seguida, querendo achar uma forma de puxar assunto sem parecer oferecida. 
Nunca fui muito boa em puxar assunto com estranhos, especialmente quando são estranhos bonitos. Mas não podia perder a oportunidade, não podia! 
E perdi. 
Ele desceu no próximo ponto, não pude fazer nada além de lamentar minha timidez.

Para minha surpresa, no dia seguinte lá estava ele. Passando pela catraca com um lindo sorriso e, como ontem, ficou do meu lado. Dessa vez ouvi um doce "Bom dia". Respondi com um sorriso.
"Que sorte a nossa, hoje o ônibus não está tão cheio" e "Hoje vai chover pra caramba" foram algumas das inúmeras frases que eu ensaiei mentalmente, mas morreram antes que pudessem ultrapassar minha garganta. Mas que bela idiota! Eu estava ali, ao lado de um cara perfeitamente estranho e não conseguia dizer nada. Talvez eu nunca mais fosse vê-lo novamente. Não importaria se eu fizesse alguma coisa errada, só não podia perder outra oportunidade. Tudo bem que eu não queria fazer besteiras, afinal, aquele poderia ser o pai dos meus futuros filhos, a pessoa com quem poderia envelhecer e passar os maiores perrengues da minha vida. Vai lá, sua idiota, fala com ele! Oh, não.

Perdida em meus devaneios sobre em que bairro compraríamos, o meu pretendido do coletivo e eu, o nosso primeiro apartamento, eu perdi, também, mais uma chance de fazer aquele cara se apaixonar perdidamente por mim. Quando me dei conta, eu já estava perto do meu ponto e quem ocupava o lugar ao meu lado era uma velhinha com óculos um pouco grandes demais que fazia tricô com uma habilidade invejável. Se eu fosse tão habilidosa com as palavras quanto aquela velhinha era com as agulhas... Desisti de pensar no homem dos olhos verdes e segui meu caminho direto para o meu nada maravilhoso trabalho. 

Trabalho vai, trabalho vem e eu só conseguia pensar em duas coisas: o homem da minha vida que perdi por burrice e, claro, na hora do almoço. Talvez se eu fosse naquele restaurante da lasanha mais gostosa do mundo, conseguiria esquecer por pelo menos uma horinha os lindos olhos verdes. Aquela lasanha fazia milagres!
Então minha hora chegou. Para meu desespero, o restaurante estava lotado e minha única opção era me sentar com alguém. Havia três lugares com pessoas sozinhas: uma senhora que parecia querer alguém para conversar, já que quase caia da cadeira tentando ouvir a conversa das moças que sentavam do seu lado, um homem com cara de psicopata e que coçava a orelha com o dedo mindinho e um outro homem que estava de costas. Resolvi pedir para sentar com ele, já que os outros não me agradaram muito.
- Com licença, posso me sentar aqui? O restauran..." 
Fiquei paralisada. ERA ELE! ELE, O CARA DO ÔNIBUS!
- Claro! Que coincidência. E aquele sorriso... Ah, que sorriso lindo! 
Aquela era a minha chance, os deuses estavam gritando para que eu falasse com ele.
- Boa tarde!, cumprimentei um pouco sem jeito. 
- Boa tarde para você também!, e mais um sorriso. Sorriso, sorriso, sorriso. Meu cérebro estava a mil! Enquanto meus olhos se fixaram, sem eu perceber, na boca do cara do ônibus, meus neurônios trabalhavam loucamente tentando arranjar uma frase-quebra-gelo perfeita para aquele momento perfeito.
- Nunca havia vindo aqui neste horário, fica bem cheio. Você vem sempre aqui?, perguntou-me enquanto usava um guardanapo para limpar a sujeira que possivelmente estava em seu rosto, percebendo que eu não parava de olhar para seus lábios. Ainda desconcertada com a cena que estava protagonizando, não respondi a pergunta prontamente. Calei-me por uns 15 segundos e finalmente soltei: 
- Não muito. Mas talvez eu comece a vir mais vezes...
- Ué, por que?

Ele parecia confuso. Mas quem não ficaria diante a possibilidade de uma louca que você encontrou no ônibus por duas vezes seguidas (e que não desviava o olhar da sua boca) estar te cantando?
- Em outros horários, para não ser surpreendida com a casa cheia, tipo hoje. 
- Ah, entendi., sorriu.

Ficamos em silêncio por alguns minutos até que nossos pratos chegaram e pudemos comentar sobre a comida ma-ra-vi-lho-sa que era servida ali desde 1953.

- E... você gosta muito de lasanha? (Não me julguem, eu não sabia o que falar e infelizmente disse a primeira coisa que me veio a cabeça)
- Gosto, é um dos meus pratos preferidos., disse meu amado, estranhando a pergunta. Eu estava tremendo, suando, não sabia se sorria ou não. Nunca passei por uma situação dessas antes.
- E qual é o seu nome?
- Laura. Eu nem acreditava, ele queria saber meu nome! Quase engasguei com o suco.
- Pedro, prazer. E um aperto de mãos. A mão dele era tão macia, queria ela me acariciando naquele momento. Ainda bem que não é possível ler pensamentos... 
- Você trabalha aqui perto ou...?
- Não, eu estou comprando um apartamento com minha noiva aqui perto e essa semana estou resolvendo a papelada e tudo mais.

N-O-I-V-A? Eu entendi bem? Minha cabeça rodou e meu sonho de ter encontrado o cara perfeito foram por água a baixo. 
- Puxa! E conseguiram encontrar? Casal de sorte, é bem difícil achar um apartamento bom e desocupado por estas bandas., disfarcei o máximo que pude. 
- Pois é, fiquei surpreso quando encontramos., sorriu.
Olá, cara! Dá para parar de sorrir? Você ainda não percebeu que partiu meu coração e está jogando fora sua única chance de ser feliz... COMIGO? 
- Imagino., sorri de volta e fiz menção de me levantar.
- Já está de saída?
- Sim, meu horário de almoço está quase no limite. 
- Ah, claro. Foi bom te conhecer, Laura.
- Bom te conhecer também. 

Os dias se passaram e vez ou outra eu me pegava pensando nele durante algumas horas ociosas.  Que vida lixo! Emprego mais ou menos, pais e amigos longe, cidade cinzenta... Opa, vai chover. Melhor eu ir me apressando para o restaurante antes que o dilúvio comece e acabe ficando presa aqui na empresa e com fome. 

A duas quadras do restaurante quase tive um infarto quando os vi. E entrando no mesmo restaurante que eu ia, solitária, almoçar. Achei um absurdo! Era para ele se casar comigo e não com aquela ridícula magricela, de cabelo tingido.
Para minha sorte, o restaurante não estava tão cheio e para minha desgraça, A ÚNICA mesa vazia era do lado deles. Sim, BEM do lado deles. Tentei disfarçar, mas ele me viu. 
- Oi, Laura! 
- Oi... 
- Amor, esta é Laura. Laura, esta é minha noiva, Raquel.
- Olá! Você é mais bonita do que eu imaginava., cumprimentei com toda a sinceridade porque, SIM, ela infelizmente era linda.
- Obrigada, quer se sen...
Antes que a eleita do Pedro, cara do ônibus, pudesse terminar a frase, eu soltei: 
- OLHA AQUI, SE VOCÊ ACHA QUE VAI SER FELIZ COM ELA, FIQUE SABENDO QUE NÃO VAI! EU SOU A ÚNICA MULHER QUE PODE TE FAZER FELIZ. SERÁ UM ERRO SE CASAR COM ESSA... ESSA MULHER!

E mais uma vez eu peço: não me julguem, por favor. Eu não consegui me controlar. Não me passou pela cabeça que todos estavam nos olhando (me olhando, a louca que surtou por causa de um cara que conheceu no ônibus há menos de um mês) e que eu não poderia fazer aquela cena, afinal, nós nunca tivemos nada na vida além de termos dividido uma mesa em um restaurante. Mas eu fiz. E antes que eu pudesse surpreendê-lo, ainda atônito com todo aquele vexame, com um beijo, sua no...

TRRRRRRRIIIIIIIM! TRRRRRRRRRRRRIIIIIIM!

1x00 Piloto

World Wild Web apresenta
                                          ASSIM NO MUNDO TODO

Estreando
                As melhores, mais intelijentas, mais interessantes, mais fabulosas, mais preguiçosas (dizem as más línguas, nós negamos... um pouco) pessoas que você poderia conhecer no mundo todo.

[TíbioePerônio] Olá, olá! [/TíbioePerônio]
Começa hoje mais uma (sendo esta a primeira neste formato) série de temporadas de filhadaputices, embalos de sábado à noite com música ao som da velha vitrola e montes de histórias do balacobaco.

Seja sabido que todos os episódios são histórias verídicas (ou nem tanto), cotidianas na vida de qualquer pessoa, em todo o mundo, e protagonizadas por essa turminha do barulho que se mete em altas confusões. Ou nem tanto.

Como a WWW é, por enquanto, um universo livre e democrático, sintam-se à vontade para enviar sugestões de pautas e, até mesmo, situações vivenciadas por vós, queridos companheiros de aventura [/SddsToddynho]. A propósito, há um formulário em ~Contatos~ para facilitar nossa comunicação, bacana né? Inéditaço. Mas não se acanhem e comentem! Falem bem, falem mal, mas falem de mim. 2bjs.
Chega de xurumelas! Apertem o PLAY e let's go!


PALAVRAS CHAVE: e lá vamos nós, vagabundagem, ócio, money money money.