2x03 O dia em que eu resolvi pular (o Carnaval)

Meu nome é Astolfo Amaral, tenho 50 e tantos, nasci em Recife e desde criança sou muito recatado. Não era arteiro como meus primos e amigos, sempre fui mais recluso e muitas vezes preferia brincar sozinho para não fazer bagunça. 

Eu cresci e, comigo, minha quietude. Por vezes fui o centro das atenções nas reuniões familiares porque um cunhado mais piadista resolvia tirar sarro da minha cara por eu ser tão calado. Minha mulher e filhos reclamam, dizem que eu não aproveito a vida. "Ora, mas eu aproveito sim, só não sou tão expansivo", digo eu. Eles aceitam, às vezes, para não criar caso. Quando não, sou eu que prometo que vou ser mais falador, mais extrovertido.

- Amaral, meu rapaz, tu tem que te soltar mais. - me disse Gio (o cunhado piadista), certo dia.
- Mas, Gio, eu sou assim, meu velho. Sempre fui, não dá pra mudar. - respondo tentando convencê-lo.
- Mas se não dá! Rapaz, toma uma lapadinha dessa caninha que tu fica em ponto de bala! 
- Home...

Acabei cedendo daquela vez, mas todos se decepcionaram, continuei eu mesmo. É, parecia que meu "ponto de bala" era calado e tímido, como de costume. Depois daquela ocasião a família resolveu dar uma trégua e não me cobrar mais para que eu fosse mais saidinho... Até que chegou o Carnaval. 

Nunca fui muito de sair no Carnaval. Ainda criança, arriscava a me fantasiar e brincar com a molecada da rua enquanto os blocos passavam em frente de casa. Na adolescência, me atrevi a ir em alguns bailes. Agora, adulto, só pego a mulher e a pirralhada, coloco no carro e vou para a praia. Nada de folia, nada de Galo, nada de Maracatu. 

- E aí, Totinha, meu velho! Carnaval vai ser aqui em casa, visse? Traz Cuca e as crianças que vai ser massa. 
- Diz lá, Marcelão! Rapaz, tu sabe que eu não gosto muito, tô pensando em ir pra praia.
- De novo? Faz isso não. Todo mundo tá vindo pra cá e eu faço questão da tua presença.
- Mas aí todo mundo vai ficar me aperreando, tu sabe... 
- Deixa disso e vem! 

Cedi, mais uma vez, e fui passar o Carnaval na casa de Marcelo, amigo de longa data. Chegando lá, parentes, amigos mais chegados e...

- Gio! Como é que tá? - perguntei já sabendo o que vinha pela frente.
- Amaral, hoje tu não me escapa!
- E em algum dia eu consegui essa proeza?
- Deixe Cuca e os meninos aí e venha cá comigo. Tenho uma belezinha pra te mostrar.
- Eita, belezinha? Tá certo. - por um momento cheguei a acreditar que ele tinha largado do meu pé com a história da afoiteza.
- COMO É? Cachaça levanta touro? E por acaso eu tô derrubado, Giovane? - me revoltei valendo.
- E não tá, não? Deixe de coisa e tome. Só um golinho. 
- Bicho...
- Menino, se tu não te soltar hoje com essa danadinha eu prometo que nunca mais te aperreio com isso.
- Promete?
- Juro!
- Ó...
- Tome logo!

E eu tomei. E o resultado vocês podem conferir no vídeo abaixo que algum engraçadinho da família fez. 








*Vídeo feito hoje, por mim, enquanto um bloco de carnaval passava na frente de casa. Alguém aí tem um parente (ou é) como o "Sr. Astolfo"?


Nenhum comentário:

Postar um comentário