1x06 Querido diário

Querido diário,
Depois de todos esses anos estou de volta. Preciso de você de novo. Desculpe minha ausência de quase 14 anos... é que a gente cresce e acaba conhecendo outros meios para resolver nossos problemas, como ir à terapia.
Mas cá estou, sem dinheiro para terapia e sem estômago para a expressão de desinteresse que todos os terapeutas têm. Talvez não sejam todos, talvez eu que não tenha sorte. 
Precisava desabafar com alguém. E como pode deduzir, ainda não aprendi a fazer amigos.
Estava desesperada, não conseguia pensar em nada que me fizesse sentir melhor, mais leve e então achei você perdido no fundo da prateleira. 
Para falar a verdade, até escorreu uma tímida lágrima quando te vi. Muitas lembranças vieram à tona, coisas realmente difíceis que enfrentei com você, meu grande e melhor amigo.
Você deve estar se perguntando "Mas o que está acontecendo?"... não, na verdade não está, pois é (infelizmente) um diário e não um ser pensante.
Mas lhe conto, mesmo assim, o que ocorre com a minha pessoa: Tenho tido mais pesadelos. Sim, AQUELES que me atormentaram tantos anos, que registrei em você por tanto tempo... 
Eles têm sido tão reais... como os velhos tempos. Me assombram a cada cochilo, não consigo dormir. Não que eu queira, tento driblar o sono de todas as maneiras possíveis. Gasto quase todo meu dinheiro em cafeína e coisas anti-sono, mas tudo nunca é o suficiente. E o dinheiro que está quase no fim.
Depois que te deixei por alguns (muitos) anos, minha vida não mudou muito da maravilha que era. Meu pai continuava me culpando por toda merda que ele fazia, comecei ir á terapia, procurar ajuda médica... e não consegui nada, nenhuma resposta concreta, nenhum remédio que fizesse efeito.
Desisti de tudo, e eles voltaram mais fortes e assustadores. As vezes acordava sangrando, com marcas pelo corpo.
Quando a coisa ficou feia, procurei psiquiatras, padres, terapeutas, e tudo o que você imaginar... e, meu caro, ninguém realmente acredita em mim. Essa é a verdade.
Acham que me agrido, que me machuco para chamar a atenção dos outros, do meu pai, do mundo... vejo isso nos olhos deles.
Queria que vissem, que vivessem tudo o que acontece nos meus sonhos... acordassem do mesmo jeito que acordo. Aquela sombra, o medo, a chuva... a escuridão. Não é justo desejar isso, mas no fundo era o que realmente queria, que todos aqueles olhares de repente fossem de medo, desespero. E por fim, me entenderiam.

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